Com o crescimento dos jatos nas rotas domésticas e a chegada dos wide-body (aeronaves de fuselagem larga) na década de 70, duas companhias do setor de aviação apostaram em comerciais de Tv com o slogan “Vá de Varig, vá de Cruzeiro” para marcar antes de tudo a facilidade de ir de um lugar a outro do país em pouco tempo, e também a integração das empresas Varig e Cruzeiro que passaram a voar juntas. Nesta época também se iniciou a expansão dos voos para a América do Sul e outros continentes do mundo, e desta forma em dez anos foram produzidos e veiculados cerca de 20 Vts. Os filmes institucionais e comerciais, que começaram na década de 60 na forma de animação e testemunhais, e ainda contaram com grandes nomes da telinha como Jô Soares, reforçaram o desenvolvimento da aviação nacional e internacional. E desta experiência mercadológica surgiram muitos sucessos que marcaram a história da propaganda nas três décadas seguintes e que são reconhecidas até hoje.
Afinal, a combinação das propostas visuais com músicas entoadas por diversos personagens como, por exemplo, Hebe Camargo e Jorge Bem Jor, continuaram mantendo viva a ideia da “Varig, varig, varig… Cruzeiro, cruzeiro”. Mais do que as brincadeiras em comerciais como “550km, 550km. Anda um pouquinho, para um pouquinho. 550km”, talvez o melhor exemplo dessa relação da marca com o público seja a bela canção de festas que se tornou referência da empresa: “Estrela brasileira no céu azul, iluminando de norte a sul. Mensagem de amor e paz, nasceu Jesus, chegou natal. Papai Noel voando a jato pelo céu, trazendo um Natal de felicidade e um ano novo cheio de prosperidade”. Criado em 1963 pelo paulistano Caetano Zamma, um dos integrantes do grupo paulista de Bossa Nova, este jingle de natal da Varig foi gravada originalmente pela cantora Clélia Simone, que fez sucesso na TV Tupi, e modificada, durante os anos. Contudo, continua memorável.
“Minha mãe diz que quando eu era criança brincava na hora dos desenhos e parava pra olhar a TV quando começavam os comerciais. Sempre fui bastante impactado pela propaganda de forma auditiva. Minha memória afetiva é muito relacionada às trilhas dos filmes. Lembro de letras inteiras das trilhas de filmes como “”Varig, Varig, Varig”, Cola Cola é isso aí” (e quase todos da Coca-Cola), “Classifone” (O Globo), Malt 90, Kamel e, mais recentemente, “Devassa Paris Hilton”, “Pôneis Malditos” (Nissan), dentre muitas outras”, comenta o publicitário e diretor da Agência Azul, Tito Santos (RJ).
Companheiras – No final da década de 70, a agência carioca Esquire Propaganda ficou responsável pela criação de campanha para Canetas Paper Mate que trazia em sua marca dois corações. Produzido e dirigido por André José Adler, que atuou por bom tempo na publicidade, em campanhas variadas (como Coristina, Tabletes Valda e Petrobrás) na época, os filmes de 15” e 30” (como a “Dois Corações”, de 1978) destacavam este como um produto adequado para todas as situações da vida das pessoas, como cerimônia de casamento, provas, reuniões e assinaturas de importantes contratos de trabalho. Com o slogan “Paper Mate – Garantia Total”, a proposta do comercial era reforçar sempre a necessidade de contar com uma caneta de confiança com um jingle marcante com uma boa marchinha, que era fácil de cantar e reforçou o seu conceito de longa vida e dois corações. “As Canetas Paper Mate faz parte da minha memória afetiva com aquele bordão ‘Tem longa vida porque tem dois corações’. O jingle era daqueles que grudam na mente das pessoas, de tão chatinho que era”, lembra a publicitária Lia Fonseca, sócia da Artecetera Comunicação (AL).
Chiclete ou não, ações como essas ajudaram a popularizar a Paper Mate (criada no início dos anos 40) que se tornou uma das marcas de esferográficas mais conhecidas. Com o tempo, o trabalho se preocupou em massificar a ideia da tecnologia agregada ao design moderno para facilitar e tornar mais simples e agradável o ato de escrever a qualquer hora. Com mais de cinquenta anos, a Paper Mate é uma das marcas mais queridas não só no mundo como no Brasil, e sinônimo de design, alta performance e inovação em instrumentos voltados à escrita.
Infância perdida – Com o comercial “Baleiro”, a Nestlé promoveu, em 1978, aquela que ficou conhecida como uma das mais tradicionais guloseimas do mercado, as balas de leite Kids, marca que hoje pertence à Arcor. O jingle da campanha embalou a infância de muitos há 30 anos no hit composto por Renato Teixeira, Sérgio Campanelli e Sérgio Mineiro, que se manteve ativo na mídia até 1985. A música se afinava perfeitamente com o vt de 30” produzido pela MCR e veiculado na televisão, além de emissoras de rádio. O comercial mostrava um menino com os olhos vidrados em um baleiro cheio de guloseimas, que ficava girando até parar para a sua felicidade e de toda criançada, ansiosa, ao seu redor.
Este sucesso gravado pelo próprio Renato Teixeira foi um dos muitos que projetaram a sua carreira, que também foi bastante expressiva na MPB. Além de compositor de clássicos como “Romaria” (memorável na voz de Elis Regina) e “Frete” (tema de abertura do seriado global “Carga Pesada”), criou trilhas para diversas marcas e empresas ao longo do tempo que permaneceram igualmente inesquecíveis como a do Ortopé. “A campanha das Balas de Leite Kids era um comercial de TV muito simples, mas totalmente memorável (pelo menos para mim). No filme, um menino girava um baleiro daqueles modelos antigos (se não me engano em um fundo branco), cantando um jingle que lembro até hoje: ‘Roda, roda, roda baleiro, atenção. Quando o baleiro parar põe a mão. Pega a bala mais gostoso do planeta. Não deixe que a sorte se intrometa. Bala de Leite Kids, a melhor bala que há. Bala de Leite Kids, quando o baleiro parar’. No final, o baleiro parava e o menino enchia a mão de balas de leite Kids. Simples e direto no desejo infantil de encher a mão de balas e comer. E nunca esqueci a música. Recentemente, quando vi o filme ‘Divertidamente’, me diverti muito vendo as cenas que o cérebro manda de volta aquele jingle que você ouviu pequena e nunca esqueceu. Me identifiquei totalmente”, acredita Renata d’Ávila, vice-presidente de planejamento e estratégia da Lew’LaraTBWA (SP).
O garoto-propaganda – Mais do que jingles incríveis e inesquecíveis a história de propaganda, conta com figuras ilustres que se tornaram a própria personificação da marca que retrataram. Assim foi com o ator Carlos Moreno, que estreou o primeiro comercial da Bombril em 1978, e se tornou o mais célebre garoto propaganda do mercado publicitário brasileiro, com mais de 400 aparições em diversos comerciais de várias linhas. O projeto, idealizado pelo publicitário Washington Olivetto, quando ainda era profissional da própria DPZ, começou com uma aparição simples de 30” em que ele argumentava, vestindo um chaleco branco de cientista, as qualidades e diferenciais do lava-louças.
O princípio básico do discurso ponderava que, apesar de produtos desta categoria serem bons e mais baratos, o do anunciante tinha um elemento na fórmula que não deixava que estragasse as mãos das donas de casa. E sendo assim, foi algo naturalmente inusitado, porém, mágico enquanto estratégia de marketing. “Agora, se a senhora não quiser gastar essa diferença, compra um outro. Depois, a senhora dá um jeito na mão, passa um creminho”. E, afinal, como não se deixar convencer por tamanho discurso. Isso fez diferença para o “Bil. O lava-louças superconcentrado da Bombril” e para o ator Carlos Moreno, que acabou indo parar nas páginas do Guinness Book, como o garoto-propaganda de maior tempo de permanência no ar ao longo dos anos.
“Tem muita coisa apaixonante na história da publicidade. Lula Vieira, Washigton e Petit, foram os primeiros gênios que conheci. Quando penso em algo ímpar, penso nas propagandas da Bombril e toda história/personagens construídos de maneira vanguardista. Vi toda a saga e hoje, folheio o livro ‘Eterno, 1001 anúncios de Bombril” sempre que posso. Definitivamente era uma minissérie de 30’’, cada capítulo era feito para nos prender mais à TV. Vibrei como um gol em uma das voltas mais geniais que já vi, na qual Carlos Moreno diz: ‘Você também é bom, só que andou reclamando. Não vai aparecer mais na TV’. Além da memória afetiva, peças como essa criaram um entusiasta. Obrigado, propaganda, Bombril e Washington”, comenta Thiago Alves, supervisor de criação da Kindle (RJ), sobre a fórmula que fez o tímido personagem em um celebridade do dia para noite, rendeu prêmios aos filmes da DPZ e lançaram Olivetto ao estrelado no mercado.
* Matéria produzida pela jornalista Ivelise Buarque para a Revista Pronews, edição de Outubro/ 2015, número 186